Por O Otimista
O Ceará encerrou o último ano tendo registrado 7.996 acidentes de trabalho. O número mostra uma queda considerável em relação a 2022, quando foram contabilizados 10.739, segundo dados enviados à reportagem pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE/CE), responsável por fiscalizar o cumprimento de leis trabalhistas através da Auditoria-Fiscal do Trabalho. Já em 2024, segundo dados compilados até o último dia 8 de julho, o Estado registrou 4.438 acidentes de trabalho, dos quais 18 foram fatais.
Avanços necessários
De acordo com Carlos Pimentel, Superintendente Regional do Trabalho, é imprescindível que as empresas mantenham padrões elevados de segurança, saúde e bem-estar para os trabalhadores. “Isso garante que os direitos dos trabalhadores sejam protegidos, promove um ambiente de trabalho justo e equitativo, e incentiva práticas empresariais responsáveis e sustentáveis”, explica o servidor com quase 40 anos de trabalho na instituição.
Em entrevista exclusiva ao O Otimista, o também auditor fiscal do Trabalho explica como são feitas as fiscalizações no Estado. “Nossa fiscalização é feita através de um planejamento onde priorizamos as denúncias recebidas. A fiscalização nos municípios está sendo efetuada semanalmente”, ressalta.
Levando em consideração os números consolidados de 2023, 27 municípios cearenses foram fiscalizados. O empecilho para estar em mais lugares, de acordo com Carlos Pimentel, decorre do quadro reduzido de auditores-fiscais, o que deve mudar a partir de 2025, com a chegada de novos profissionais.
Legislação e desafios
O superintendente considera fundamental o cumprimento das normas de segurança do trabalhador, como forma de fazer valer as normativas vigentes e garantir maior saúde aos funcionários. “Cabe a todos a manutenção de um ambiente de trabalho hígido, reduzindo os riscos inerentes ao trabalho, incluindo os riscos de cunho psicológico e emocional. Essas leis são fundamentais para proteger os trabalhadores e reduzir o número de mortes e acidentes no trabalho”, afirma.
Entre os caminhos apontados pelo gestor, está a adoção de ações educativas e de treinamento, bem como avaliação de riscos e políticas bem estabelecidas de segurança. “Inspeções regulares, cultura de segurança com envolvimento dos trabalhadores e melhoria contínua nos processos são fatores fundamentais para a redução dos acidentes de trabalho e doenças ocupacionais”, reforça.
Outra grande mazela, a situação do trabalho análogo à escravidão, também precisa de atenção abrangente e coordenada, conforme aponta Carlos Pimentel. Foram resgatadas, em 2023, 38 pessoas enquadradas como vítimas de condições análogas à escravidão. “No Ceará, como em outras regiões do Brasil, é necessário implementar uma série de medidas para erradicar essa prática. Para mudar o cenário, é necessário um esforço conjunto e coordenado de diversas frentes, incluindo governo, sociedade civil, empresas e comunidade internacional. A implementação de políticas públicas eficazes, educação e conscientização, a fiscalização rigorosa e o apoio às vítimas são fundamentais para erradicar essa prática desumana e garantir condições dignas de trabalho para todos”, finaliza.
Fiscalização e efetivo de agentes deve crescer
Especialistas são uníssonos ao destacar que o tema do trabalho, seja pelo viés da segurança ou dos casos persistentes de situações análogas à escravidão, tem ganhado novamente o debate nacional, passo importante para resolver essa problemática.
Segundo Leila Paiva, advogada e presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/CE, o trabalho escravo permeia a realidade brasileira numa dimensão histórica. “Relatos da literatura já apontam casos desde períodos como o da borracha na Amazônia ou a construção de Brasília. Assim, sabemos que após a garantia da legislação dos direitos trabalhistas e sociais, é preciso fortalecer a prevenção e ações repressivas que vão desde a fiscalização até a responsabilização dos culpados”, explica.
“Os casos que foram amplamente denunciados na mídia e os dados dos resultados das fiscalizações demonstram que não há um setor específico no qual exista trabalho análogo à escravidão. É uma situação muito mais presente na realidade brasileira do que se pode imaginar. Assim, é preciso avançar na fiscalização em mais setores da economia, em mais estados e regiões do País”, frisa Leila.
Ampliação da fiscalização
Para Rafael Sales, doutorando e mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/CE, a fiscalização no ambiente de trabalho é essencial para garantir que a legislação trabalhista seja respeitada, algo que, segundo ele, só vai ocorrer na prática com um maior efetivo de profissionais atuando em campo. Essa atuação mais efetiva ajudaria, inclusive, a diminuir os casos de trabalho forçado.
“Recentemente foi aberto um grande concurso, vão ser chamados vários auditores fiscais do trabalho, então a gente espera que venha aqui para o Ceará, mas, dentro do cenário desenhado, ainda está longe de chegarmos ao ideal, que seria pelo menos ter um auditor para cada cidade”, destaca.
A exploração indevida da mão de obra, frisa o especialista, ajuda a aumentar outro sério problema: os acidentes de trabalho. Segundo ele, tais ocorrências são registradas, em grande maioria, quando há trabalhadores em jornadas extenuantes e quando não há um treinamento adequado. “Quando as normas que são editadas pelo Ministério do Trabalho não são seguidas e quando não há uma fiscalização mais efetiva, então as chances de acidente acabam aumentando”, afirma o advogado.