Edição 155 – Fev/Abr / 2025
Interesses políticos, estruturas defasadas, falta de capacitação e baixa remuneração demonstram a pouca valorização do APH no país
Por Paula Barcellos/Editora e Jornalista da Revista Emergência
“Eu estava no 2º ano da Residência em Medicina de Emergência quando ingressei no APH. Até então, imaginava que já dominava a emergência e que tudo o que eu encontraria no APH já teria visto dentro da sala de emergência do serviço terciário. Até que veio o choque de realidade: fui acionada para um atendimento de PCR em domicílio. Lá estava o paciente, na cama, em um quarto pequeno, abafado e escuro. Familiares ajoelhados no corredor, chorando e rezando. Num piscar de olhos, todo o cenário mudou. A cama foi erguida na parede para criar espaço, o paciente já estava no chão, eu estava verificando o ritmo com as pás do monitor, a enfermeira já tentava providenciar um acesso, enquanto o condutor realizava a MCE. Tudo isso com uma equipe reduzida, mas extremamente coordenada e eficiente. Ali começou minha transformação. Passei de alguém que subestimava o APH para alguém que luta diariamente e que respeita profundamente esse serviço – e, mais que isso, me apaixonei por ele. Hoje, sou médica Emergencista e dedico grande parte do meu tempo ao APH. Sempre que possível, levo minhas residentes para terem esse contato precoce e mudarem sua visão sobre o serviço. Essa integração entre os mundos intra e extra-hospitalar fortalece todo o sistema de emergência e, no final, quem realmente sai ganhando é o paciente. Valorizar o APH não é apenas uma questão de reconhecimento profissional, mas de enxergar a importância desse serviço dentro da cadeia do atendimento de urgência e emergência. Políticas que promovam essa conscientização dentro da própria classe médica são essenciais para garantir que o APH receba o respeito e o investimento que merece”.
Esse é um relato profundo e apaixonado da médica Reguladora e Intervencionista do SAMU Cascavel/PR, especialista em Medicina de Emergência e pós-graduada em Transporte e Resgate Aeromédico, Deborah Maccari, sobre a profissão de APH e sua representatividade no setor de urgência e emergência. Mas, infelizmente, não é esta a visão que predomina no país, nem dos próprios órgãos nem da sociedade. A profissão sofre com a pouca valorização em questões fundamentais como estrutura, técnica, formação, capacitação, remuneração e com o desconhecimento da sociedade sobre a atividade, o que gera desrespeito e, muitas vezes, violência contra o profissional. E tudo isso acarreta sofrimentos físicos e psíquicos em quem atende, prejudicando a qualidade do trabalho. Consequentemente, a população também sofre.
Especialistas entrevistados na reportagem destacam que a realidade da profissão no país tem base em uma gestão alheia às necessidades do setor. “O APH no Brasil é um reflexo da situação de outros setores da área da saúde. A grande maioria dos secretários de saúde no Brasil, sejam municipais, sejam estaduais, não é da área da saúde. Alguns conseguem montar uma boa equipe técnica para seu suporte, mas a maioria não consegue ou não tem a mínima ideia de como fazê-lo. O mesmo vale para o Ministério da Saúde. Apesar da existência da Portaria 2048/2002 que regulamenta os materiais e a capacitação das equipes, na grande maioria dos locais isto não é cumprido e a própria Vigilância Sanitária, que deveria fiscalizar estas situações, não cobra por questões de conflitos de interesse, geralmente político”, diz o médico Intervencionista do SAMU Metropolitano Salvador/BA, Oswaldo Alves Bastos.
Aliás, a política atrapalha muito o bom andamento e a valorização da profissão. “Um dos grandes problemas da realidade do APH é a política. Em alguns contextos, critérios técnicos ainda não são priorizados para a seleção e alocação dos profissionais, o que pode gerar desmotivação entre aqueles que se dedicam ao aperfeiçoamento contínuo”, revela Deborah. Antonio Onimaru, médico emergencista e regulador, também destaca a influência da política sobre a profissão. Ele ressalta que o serviço de APH está sendo utilizado como máquina política por gestores, um crime que é tratado como normal no Brasil. “Infelizmente gestores políticos, de uma maneira geral, que fazem o mau uso desta máquina, são verdadeiros criminosos, que fazem com que não se valorize esse serviço”, desabafa Onimaru.
CAPACITAÇÃO E FORMAÇÃO
Um outro grande desafio dos profissionais de APH, segundo os especialistas, diz respeito à capacitação e treinamento e especialização na área. “O APH hoje é uma realidade no Brasil. Temos serviços na esfera pública e privada. Podemos dizer que o mais conhecido deles é o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência, o SAMU, mas temos também o serviço de APH presente nas concessionárias de rodovias, nos corpos de bombeiros. Sendo assim, todo profissional do APH enfrenta alguns desafios que podem ser específicos de sua área ou comum a outras áreas. Comum, poderíamos dizer que seria a capacitação e atualização, pois sua ação na maioria dos atendimentos precisa ser rápida e precisa. E para tomar decisões certas num cenário de estresse o profissional precisa ter calma, e como eu sempre falo, o conhecimento traz segurança e a segurança traz calma. Então não é possível o profissional ter sucesso na urgência sem o conhecimento e a capacitação contínua”, avalia Josiene Germano, especialista em Medicina de Tráfego e área de atuação Medicina Aeroespacial.
Confira a reportagem completa na edição de fev/abr / 2025 da Revista Emergência.