sábado, 14 de junho de 2025

Emancipação fortalece corporações, mas requer expansão do serviço

Data: 06/02/2012 / Fonte: Revista Emergência

Vinte e três anos depois da promulgação da Constituição Federal, quando conquistaram o direito de emancipação, os corpos de bombeiros no Brasil enfrentam novo momento marcante. Propostas em debate podem elevar para 26 o número de corporações independentes – apenas São Paulo não tem, atualmente, debate sobre uma possível separação da PM (Polícia Militar).

Paralelamente ao sonho do comando próprio, além de suas implicações e benefícios, os bombeiros militares enfrentam a evolução de modelos mais praticados fora do Brasil, com bombeiros profissionais, civis e voluntários, que crescem em importância diante do aumento dos desastres naturais e colocam-se como alternativa para atender aos municípios desassistidos pelo Estado.

O exemplo do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul é, talvez, o mais pontual. A instituição, que completará 117 anos em março, aproxima-se da emancipação da Brigada Militar a partir de um grupo de trabalho, estabelecido pelo Governo do Estado, que trabalha na proposta desde junho de 2011.

Com 118 unidades em 95 municípios, a corporação está presente em menos de 20% das cidades gaúchas, embora atue nas mais populosas, indica seu comandante, o coronel Henrique Vanderlei Lampert Silva.

O efetivo de 2.300 homens corresponde a apenas 10% do total da Brigada Militar. Como agravante, no início de 2013, apesar do ingresso de 600 novos bombeiros, há risco de o efetivo ser ainda menor, dada a saída prevista de vários outros militares. A reposição não contínua é insuficiente, alega o comandante.

Além de frear qualquer possibilidade de expansão da cobertura do serviço no Estado, a falta de recursos humanos ainda tem provocado a inoperância e até o fechamento de quartéis. “Não pensei que seria um comandante deste bombeiro fragilizado”, lamenta Lampert.

A saída, aponta ele, passa pela emancipação da corporação, mas de forma planejada. “Vamos emancipar os bombeiros? Sim, mas como vamos convencer o Governo a fazer uma inclusão de recursos humanos para o futuro bombeiro emancipado? Temos que nos preparar para o que queremos ser no futuro”, diz. “Não podemos ser imaturos achando que vamos ser independentes na semana seguinte à emancipação”, completa.

A preocupação de Lampert encontra amparo na opinião do professor e pesquisador Carlos Eduardo Riberi Lobo, doutor em Ciências Sociais e mestre em História Social. Embora considere que uma corporação emancipada tenha maior poder decisório e possa se dedicar à sua função principal, ele alerta que a autonomia e a capacidade de melhoria dos serviços somente irão ocorrer se o Estado investir significativamente no corpo de bombeiros, ou seja, em efetivo, formação, equipamentos e viaturas.

O desafio atual do Rio Grande do Sul já foi enfrentado por 23 corporações que emanciparam-se da PM, algumas de forma consensual, outras litigiosa, geralmente com poucos bombeiros. Em outubro de 1989, Goiás e Mato Grosso do Sul foram as primeiras a conquistar a autonomia, juntando-se a Rio de Janeiro e Distrito Federal, que já nasceram independentes.

Ao lembrar das dificuldades na época, o Comandante-Geral do CBMGO (Corpo de Bombeiros Militar de Goiás), coronel Carlos Helbingen Júnior, cita justamente o desligamento completo da estrutura administrativa da PM, com os bombeiros tendo que executar todos os atos administrativos legais de gestão orçamentário-financeira e de pessoal.

A autonomia, contudo, melhorou os serviços prestados, ampliou a presença dos bombeiros no Estado e auxiliou nos investimentos em veículos, equipamentos e aprimoramento profissional. “Analiso o CBMGO pós-emancipação como uma corporação que nasceu de novo, com muita força e vigor, com um efetivo reduzido que optou voluntariamente pela digna missão de alavancar uma instituição”, refere.

Quando da separação, cerca de 600 militares decidiram integrar o CBMGO definitivamente. Hoje, o efetivo chega a 2.564 militares – um crescimento de 320%, mas ainda aquém dos 4.293 previstos em lei. Em 1989, a corporação possuía 12 viaturas, já consideradas obsoletas e ineficientes. Atualmente, a frota chega a 410 veículos de diversas categorias. Também 32 novos municípios passaram a contar com quartéis da corporação desde então.

Conforme Helbingen, o CBMGO está perto de ser beneficiado pela aprovação de uma lei que criará fundo especial específico para a corporação, o que permitirá que as ações e temas estratégicos sejam implementados com a destinação dos recursos necessários para sua execução.

No Espírito Santo, uma solução para as dificuldades iniciais pós-emancipação veio justamente com o Fundo Especial de Reequipamento do Corpo de Bombeiros Militar, criado pela Lei Complementar nº 102, em 1997, ano da desvinculação.

O objetivo, conta o tenente-coronel Carlos Marcelo D`Isep Costa, comandante do 4º BBM (Batalhão de Bombeiros Militar), foi prover recursos financeiros para a nova corporação que, na época, tinha unidades em cinco cidades, hoje está em 11 e tem a previsão de ter quartéis em 16 dos 78 municípios capixabas até 2014. Já o efetivo saltou de 560 para 1.200 bombeiros.

Pressão

Em um período de dez anos pós-Constituição, 15 corporações emanciparam-se. Algumas só concretizaram a separação após superarem a pressão contrária inicial. No Ceará, em 1988, uma reunião com o Subcomandante-Geral da PM buscou esvaziar a pretensão, relata o coronel bombeiro da reserva José Ananias Duarte Frota, ex-comandante-geral no Estado e presidente da Ligabom (Liga Nacional dos Corpos de Bombeiros Militares do Brasil) de 2005 a 2006. A autonomia acabou conquistada dois anos depois.

No Espírito Santo, o movimento dos bombeiros também foi duramente combatido pela cúpula da PM a partir de 1989, revela o tenente-coronel D`Isep. Ele relata ter testemunhado ameaças de punição aos bombeiros para minar as tentativas de emancipação, alcançada após oito anos.

Entretanto, em 1995, quando o processo de emancipação começou a desenvolver-se, um grupo de oficiais da PM idealizou o projeto “P3M – Rumo ao Terceiro Milênio” que incluía, em um subprojeto, a separação das atividades policiais das de bombeiros.

Conhecendo o histórico enfrentado pelos colegas, Lampert quer garantir a autonomia, aproveitando o bom momento da relação com a Brigada Militar, cujo comando tem permitido concessões importantes aos bombeiros, ao contrário de interferências sofridas em anos anteriores. “Os bombeiros não podem mais ficar à mercê do humor de um comandante-geral”, justifica.

Um grupo de trabalho foi estabelecido internamente pelo comando dos bombeiros gaúchos, em paralelo ao proposto pelo Governo estadual. Segundo Lampert, a história da separação e os 13 anos de autonomia do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais vêm sendo considerados como o exemplo mais próximo da realidade no Rio Grande do Sul.

Reportagem de Rafael Geyger

Leia a matéria completa na edição de fevereiro da Revista Emergência

Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom


 

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3 COMENTÁRIOS

  1. Organização interna e amparo legal bem definidos fará com que o CBM do Rio Grande do Sul alcance à excelência na prestação dos seus serviços. Sou do CBM de Sergipe que desde dez/1999 se emancipou da PMSE, porém até os dias atuais não temos sequer a nossa lei de organização básica, aliado a isto temos um efetivo reduzidíssimo para atingir as nossas pretensões nos limites do nosso território. Ainda, Passamos atualmente por uma crise institucional na qual alguns dos seus integrantes, oficiais e praças, não estão peocupados com os destinos que a nossa Corporação está por seguir, tais como o descrédito junto à opinião pública e toda a sociedade sergipana, o ócio está tomando conta, algumas disputas pessoais internas estão prestes a por por terra todo o sonho de uma Instituição em busca de mostrar para essa sociedade porque se emancipou.
    Algumas leis são de suma importância para a sobrevivência de uma nova Instituição bombeirística: Código Contra Incêndio e pânico que reflita a realidade do Estado, Lei de organização básica, lei de fixação de efetivo, lei de promoção de oficiais e de praças e um regulamento administrativo que abarque não só a parte disciplinar como tb que defina as atribuições dos seus órgãos internos, etc.
    Alguns Corpos de Bombeiros ao se emanciparam se preocuparam em criar uma lei para cobrança da taxa de incêndio, como foi o caso do CBMSE, porém pela falta de cultura e persistência dos administradores do próprio CBM e do Estado essa lei virou letra morta, é necessário tb a elaboração de lei que trate do tema eventos e análise de projetos contra incêndio e pânico.
    O aumento da demanda das necessidades do Estado aumenta sobremaneira quando se tem um CBM independente, ele passa a ser uma das mais respeitadas organizações do Estado, uma vez que o próprio MPE reconhece essa importância, pois nos solicita até para resolvermos problemas que vão desde animais soltos na via pública até problemas mais complicados e técnicos, não querendo dizer que o problema dos animais soltos na via pública não tenha tanta importância, não. Citei apenas para mostrar que assuntos relacioandos à competência de outros órgãos como é o caso desse exemplo nós somos convidados para dar soluções, tais como: locais para entrega desses animais devidamente dentro das normas da vigilãncia sanitária, etc.
    Mas, uma coisa é fato incontroverso, a Instituição se torna mais reconhecida pelos seus serviços e contribui para a diminuição dos sinistros.
    Por aqui, nossa emancipação teve início com uma Emenda à Costituição Estadual criando de direito o CBMSE além da lei de emancipação e das leis: Código Contra Incêndio e Pânico do Estado de Sergipe e da Lei que criou algumas taxas pelos serviços prestados pelo CBMSE, são elas Taxa anual de segurança contra incêndio e as taxas pela análise dos projetos contra incêndio e pânico. Mas como dito acima a nossa taxa anual de segurança contra incêndio não vingou e só foi lançada em 2001 e 2003 pondo-a em descrédito junto à população estadual.
    Desejamos que os companheiros do Rio Grande do Sul saibam aproveitar as melhores experiências das demais corporações que se emanciparam para que não evitar os mesmos erros. Dessa forma nos colocamos à disposiçãodos amigos gaúchos para quaisquer esclarecimentos
    Cel Wagner
    Diretor Operacional do CBMSE

  2. UMA PARCERIA ENTRE O ESTADO COM OS CORPOS DE BOMBEIROS MILITARES E AS PREFEITURAS COM OS BOMBEIROS CIVIS VOLUNTÁRIOS. SERIA UM IDEAL IMEDIATO PARA SOLUCIONAR A FALTA DE BOMBEIROS NO PAIS. NO RIO GRANDE DO SUL POR EXEMPLO: GRANDE PARTE DAS EMERGÊNCIAS SÃO ATENDIDAS COM GRANDE EFICIÊNCIA PELOS BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS. NÃO É UMA QUESTÃO DE CONCORRÊNCIA ENTRE PROFISSIONAIS MILITARES E CIVIS. APENAS UMA SOLUÇÃO IMEDIATA PELA INCAPACIDADE GOVERNAMENTAL DE INSTALAÇÃO DE UNIDADES DO CORPO DE BOMBEIROS EM CIDADES DO BRASIL. NO PLANETA 95% DAS CORPORAÇÕES DE BOMBEIROS SÃO DE FUNCIONÁRIOS CIVIS DA PREFEITURA E DE MEMBROS DA PRÓPRIA COMUNIDADE QUE ATUAM COMO BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS! UM GRANDE EXEMPLO ACONTECE EM ALGUMAS CIDADES DO PARANÁ QUE MILITARES E BOMBEIROS COMUNITÁRIOS TRABALHAM JUNTOS.

  3. COM A EMANCIPAÇÃO DOS BOMBEIROS, ESPERO QUE O ESTADO NÃO DEIXE SOMENTE PARA AS PREFEITURAS A RESPONSABILIDADE DE GERENCIAR OS PROBLEMAS. NÃO VAMOS ESQUECER QUE SEGURANÇA PÚBLICA É DEVER DO ESTADO, AS PREFEITURAS PASSAM A SER SOMENTE UM COADJUVANTE. A POPULAÇÃO EM RAZÃO DE CERTAS IGNORÂNCIAS COMEÇA A PERCEBER, E AS VEZES PARTICIPAR DOS PROBLEMAS SOCIAIS SOMENTE QUANDO É VITIMA, ESQUECE QUE A “VIDA PRA SER BEM VIVIDA É NECESSÁRIO TER ALIMENTO TODO DIA”.

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