sábado, 28 de junho de 2025

Gases Inertes e Especiais: estratégicas modernas e seguras para controle de incêndios

A descoberta do fogo pode ser considerada uma das maiores conquistas do ser humano na pré-história. Durante o inverno, o fogo protegeu os seres humanos do frio intenso. Além disso, os primeiros humanos aprenderam a cozinhar alimentos em fogueiras, tornando os pratos mais saborosos e saudáveis, pois o calor eliminava muitas bactérias presentes na carne e proporcionava ainda proteção contra predadores. Esse domínio do fogo foi fundamental para a evolução e sobrevivência humana. No entanto, o uso inadequado, menosprezado e descontrolado do fogo pode gerar uma série de problemas significativos, incluindo incêndios florestais capazes de devastar grandes áreas de vegetação, afetar ecossistemas e a biodiversidade, além poder destruir habitats naturais, o que, em casos mais graves, pode levar à extinção de espécies.

O fogo descontrolado pode destruir propriedades, resultando em perdas econômicas para indivíduos e comunidades, além de colocar em risco a vida das pessoas. A queima descontrolada de materiais pode ainda liberar poluentes nocivos na atmosfera, afetando a qualidade do ar e a saúde pública em geral. Juntamente com os incêndios florestais e a queima de combustíveis fósseis, essas práticas contribuem para a emissão de gases de efeito estufa, que contribuem para o agravamento das mudanças climáticas. Por isso, a prevenção é de extrema importância.

A definição de fogo como uma reação química de oxidação, que envolve a liberação de luz, calor e gases, está alinhada com os princípios da química, especialmente os estudos de Antoine Lavoisier, considerado o pai da química moderna. Portanto, podemos afirmar que o fogo é resultado da reação de um combustível com um oxidante, geralmente o oxigênio do ar. Essa combustão produz energia na forma de calor e luz, além de subprodutos gasosos.

CONCEITOS E DEFINIÇÕES ATUAIS SOBRE FOGO
Atualmente, abordamos o conceito do tetraedro do fogo, que é um modelo que ilustra os quatro elementos essenciais necessários para a ocorrência da combustão. O tetraedro do fogo proporciona uma compreensão mais abrangente das condições necessárias para a combustão, enfatizando que a reação em cadeia é crucial para a manutenção do fogo. Assim como no triângulo do fogo, se qualquer um dos quatro elementos for removido, a combustão não ocorrerá. Em resumo, o tetraedro do fogo é um modelo crítico e atual que ajuda no entendimento da dinâmica da combustão e a desenvolver estratégias eficazes para a prevenção e combate a incêndios.

Baseado no tetraedro do fogo, as formas de extinção de incêndios representam estratégias para remover um ou mais dos 4 (quatro) elementos necessários para que a combustão ocorra (combustível, oxigênio, calor e a reação química em cadeia). As principais formas de extinção incluem:

  1. Remoção do Combustível: Esta estratégia consiste em isolar, separar e/ou retirar o material combustível (inflamável) da fonte de ignição.
  2. Remoção do Comburente: Essa abordagem envolve o abafamento, que consiste em cobrir o fogo com materiais que não permitem a passagem de oxigênio, ou a supressão da presença do oxigênio, criando uma atmosfera inerte.
  3. Remoção do Calor: Refere-se ao resfriando do combustível, diminuindo/reduzindo sua temperatura abaixo do ponto de ignição.
  4. Interrupção da Reação Química em Cadeia: Esta estratégia utiliza produtos químicos que interrompem a reação em cadeia da combustão. O pó químico seco (PQS), é um exemplo de agente que pode interromper essa cadeia.

Os agentes halogenados também são eficazes na interrupção da reação de combustão, reduzindo a temperatura e a capacidade de combustão do material.

Após esta introdução, abordaremos a aplicabilidade de alguns gases no combate a incêndios, sua eficácia e a ação que exercem sobre o tetraedro do fogo.

GASES INERTES
Quimicamente podemos dizer que os gases inertes são gases que não reagem facilmente com outras substâncias em condições normais. Eles têm uma baixa reatividade química devido à sua estrutura eletrônica estável, o que os tornam ideais para diversas aplicações, incluindo o combate a incêndios. O Nitrogênio (N2) por exemplo, tem larga utilização na área petrolífera e petroquímica, sobretudo em ambientes onde há risco de incêndios, como nas operações de corte a quente. Ele também pode ser utilizado em sistemas de supressão de incêndios em áreas críticas, como salas de servidores, centros de controle, praça de maquinas, etc… O argônio também é um gás inerte que pode ser usado em sistemas de combate a incêndios, especialmente em ambientes onde a proteção de equipamentos sensíveis se faz necessária. Mas o agente inerte mais utilizado sem sombra de dúvidas é o dióxido de carbono (CO₂), que é frequentemente utilizado em extintores de incêndio. O CO₂ desloca o oxigênio em torno do fogo, sufocando (abafando) as chamas e interrompendo assim a reação de combustão.

Conforme a NFPA 12 (Standard on Carbon Dioxide Extinguishing Systems), o gás carbônico atua por deslocamento do oxigênio (abafamento), com leve efeito de resfriamento. Mas, devido ao risco de asfixia, não é recomendado para áreas normalmente ocupadas, tendo gerado acidentes em porões e praça de máquinas de embarcações. A Norma NFPA 12 (National Fire Protection Association) recomenda que seja realizada a evacuação geral da área antes da descarga e presença de sistema de alerta (sonoro e luminoso) para evitar acesso e permanência de pessoas na área de atuação do gás.

A NFPA 12 além de dos diversos aspectos abordados, reforça os temas relacionadas à segurança dos ocupantes e dos operadores durante a liberação do dióxido de carbono, uma vez que como dito, ele pode ser perigoso em concentrações elevadas.

GASES ESPECIAIS (FM-200, Novec 1230)
A norma NFPA 2001, intitulada “Standard on Clean Agent Fire Extinguishing Systems”, estabelece requisitos para sistemas de extinção de incêndios que utilizam agentes limpos. Esses agentes são substâncias que extinguem incêndios sem deixar resíduos, sendo adequados para a proteção de áreas sensíveis, como salas de controle, servidores, laboratórios e outros ambientes onde equipamentos eletrônicos e materiais críticos estão presentes. A norma garante que esses sistemas sejam projetados, instalados e mantidos de maneira eficaz e segura, assegurando a proteção de propriedades e vidas. Dentre os gases especiais, destacamos:

FM-200
O FM-200, nome comercial do heptafluoropropano (C3HF7), é um agente extintor de incêndio limpo, que extingue sem deixar resíduos. Ele é amplamente utilizado em sistemas de extinção de incêndios, especialmente em ambientes onde a proteção de equipamentos eletrônicos e materiais sensíveis é crítica, assegurando a eficácia e a segurança na proteção desses locais. O FM-200 atua interferindo nas reações químicas que ocorrem durante a combustão, essencialmente interrompendo a sequência de reações que mantém o fogo. Essa interrupção se dá pela redução da temperatura e da concentração de radicais livres, que são essenciais para a continuidade da combustão.

Embora sua atuação não seja predominantemente por resfriamento, o FM-200 também pode absorver calor (efeito endotérmico), contribuindo assim para a redução da temperatura do ambiente. A combinação da remoção de calor e a quebra da reação química em cadeia são fatores que tornam o FM-200 muito eficaz na extinção de incêndios. Como não atua na redução do comburente (oxigênio), pode ser utilizado em áreas normalmente ocupadas, desde que sejam respeitados os limites de exposição ocupacional estabelecidos, os quais devem ser observados para garantir a segurança das pessoas no ambiente.

Mesmo o FM-200 sendo seguro para uso em ambientes ocupados, recomenda-se que as pessoas evacuem a área antes da sua liberação, especialmente em situações de incêndio. Isso minimiza quaisquer riscos potenciais e assegura a segurança de todos. A segurança dos ocupantes deve sempre ser a prioridade em qualquer situação de combate a incêndios.

Novec 1230
O Novec 1230, também conhecido como FK-5-1-12, é um agente extintor de incêndio classificado como um fluido de supressão limpo. Foi concebido para ser uma alternativa eficaz e ambientalmente adequada aos sistemas de extinção de incêndio que utilizam outros agentes que podem gerar impactos e consequências negativas no meio ambiente.

A NFPA 2001 reconhece o Novec 1230 como um agente extintor eficiente e seguro para uso em ambientes ocupados, com diretrizes específicas para sua aplicação, instalação e manutenção em sistemas de combate a incêndios, pois ele é um fluido de supressão de incêndios projetado para ser seguro, não tóxico e ambientalmente amigável. Ao ser liberado, vaporiza-se de forma rápida, formando uma neblina que se dispersa no ambiente.

O Novec 1230 contribui para a extinção de incêndios pela remoção do calor e pela interrupção da reação em cadeia da combustão. A norma especifica as concentrações adequadas do agente para garantir a eficácia na extinção de incêndios, ao mesmo tempo em que mantém a segurança dos ocupantes. Nenhum dos 2 (dois) agentes (FM-200 e Novec) representam riscos à saúde quando utilizados conforme a concentração de projeto estabelecida pela NFPA 2001. No entanto, é sempre recomendado que as pessoas sejam retiradas da área antes da sua liberação, não em razão do agente em si, mas para evitar a permanência em locais onde possa haver presença de fumaça residual bem como para garantir a segurança pessoal em caso de falha do sistema de detecção, alarme ou descarga.


O blog Emergência em Pauta trata do gerenciamento de emergências e segurança contra Incêndio e Pânico. O autor do blog é Marco Aurélio Nunes da Rocha, técnico em Segurança e em Química. Emergency Medical Technician (EMT-B). Graduado em Química e em Segurança, Licenciado em Biologia e em Pedagogia. Mestre em Prevenção de Riscos. Pós-Graduado em Gerenciamento de Crises, Emergências e Desastres, em Segurança e Higiene Ocupacional, em Toxicologia Geral e em Segurança contra Incêndio e Pânico. Especialista em Psicopedagogia e em Urgência e Emergência Pré-hospitalar. Professor de cursos de Pós-Graduação de Engenharia de Segurança, Medicina do Trabalho, Enfermagem do Trabalho e em Urgências e Emergências, Engenharia de Prevenção e Combate a Incêndios, Defesa Civil, Gestão de Crises, Emergências e Desastres e APH Tático Militar e nos MBAs Executivos de Gerenciamento de Crises e de Safety e Security. Diretor do SINDITEST/RS.
rochasafety@yahoo.com.br

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